segunda-feira, 29 de novembro de 2010

ANTIBIÓTICOS e DROGAS

ANTIBIÓTICOS e DROGAS.
Dr.Aloyzio Achutti. Médico.

Desde o fim de semana não basta mais ter dinheiro para comprar antibióticos no balcão da farmácia. Agora, como já acontecia com psicotrópicos, opiáceos e outras drogas capazes de provocar dependência, é preciso ter uma receita médica.
Uma das explicações para a restrição está no surgimento de resistência bacteriana, superbactérias mais rapidamente adaptadas aos antibióticos, do que nossa capacidade de encontrar armas mais poderosas para combatê-las. Outra está na destruição de nossa flora normal e necessária para a vida, dando chance para oportunistas tomarem conta do território conflagrado, aproveitando-se do desequilíbrio provocado entre nossos comensais.
Os antibióticos - como está expresso em seu nome - são armas mortíferas, contra a vida, destinadas a matar micro-organismos vivos, na presunção de liquidá-los antes do hospedeiro.
Logo depois da descoberta destes remédios houve uma euforia (originada de arrogante ignorância), achando que doenças infeciosas haviam desaparecido...
Nossas origens estão nestas formas microscópicas de vida, e delas depende ainda hoje nosso sustento, de parceira com a digestão e o equilíbrio ecológico. Precederam-nos neste mundo a cerca de três bilhões de anos, enquanto somente a um milhão surgiram seres como nós. Temos mais delas em nossos corpos do que de nossas próprias células. Precisamos delas para sobreviver, para manter condições de troca com o meio ambiente, e limpar nossos estragos.
Nós médicos aprendemos uma lição: o equilíbrio, a manutenção de condições adequadas de vida, e a prevenção de doenças são essenciais. Não somos capazes de restabelecer o equilíbrio e a saúde com a violência de armas – farmacológicas ou de qualquer outra natureza - por mais poderosas que sejam.
A mesma lição não poderia servir também para tratar organismos sociais doentes?
A dependência e o tráfico de drogas são sintomas como a febre e a dor, num organismo vivo em desequilíbrio e infectado. No caso da enfermidade social é ainda pior: os usuários dependentes, como células doentes, fazem parte do tecido e se constituem na própria razão do tráfico. Forma-se uma rede complexa cuja inteligência não se encontra na favela, e seus maiores beneficiários estão em geral muito bem escondidos, e intimamente entranhados nas estruturas de poder, e no fluxo do dinheiro.
Não podemos mais prescindir dos antibióticos, cujo uso precisa ser controlado, mas sem a ilusão de que estas armas sejam suficientes para controlar as doenças infecciosas.
As drogas, seu tráfico e seus comandantes, encontraram na própria natureza humana e no desequilíbrio social um mercado, embora ilegal, extremamente sólido e rentável, cuja erradicação passa pelo controle do usuário, pela oportunidade de educação, identidade, integração social e emprego digno, capaz de competir com as oportunidades oferecidas pelo tráfico.
Tanques, fuzis e estratégia militar, assim como os antibióticos, também podem causar mais estragos e favorecer oportunistas. Não podemos nos iludir sobre a solução de problemas há tanto tempo tolerados e consentidos, especialmente porque a razão de sua existência não está localizada onde a guerra hoje se desenvolve.

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