quinta-feira, 4 de novembro de 2010

"Não há silêncio que não termine" - Ingrid Betancourt. Ed. Cia das Letras

O meu livro de cabeceira (e recente companheiro de viagens de avião) conta fatos ocorridos com Ingrid durante os quase sete anos em que esteve mantida seqüestrada na selva colombiana pelas FARC. A autora descreve de forma poética e emocionante fatos cruéis e a partir deles faz reflexões sobre sua solidão, medo, angústias, sofrimento na luta que travou pela liberdade. Sentimentos esses comuns a todos nós, pelo menos em algum momento da vida...

Eu me emocionei em algumas passagens do livro, tamanha a minha identificação com os pensamentos e sentimentos de Ingrid. Parecia que ela estava a descrever exatamente coisas que já passei e senti...

Acredito que o bem maior que temos é a liberdade, pois uma vida sem liberdade, já não é uma vida plena, falta dignidade. Descrevo a seguir alguns trechos do livro, recomendando esta magnífica leitura a todos:

            "O rio estava ali, avançando aos borbotões, trazendo furiosamente em seu leito árvores inteiras que pareciam pedir ajuda. Aquela água borbulhante me intimidou. No entanto, eu precisava me jogar nela e me deixar levar. Esse era o preço da salvação.
               Fiquei imóvel. A ausência de perigo iminente me fornecia boas razões para não mergulhar. A fraqueza tomava forma. A covardia tomava forma. Aqueles troncos de árvores que rolavam na água e desapareciam para reaparecer mais adiante, com seus galhos estendidos para o céu, eram eu. Via minha vida ser engolida por aquela lama líquida. Minha covardia intentava pretextos para postergar a ação (...)
            Mas estava tomada por um medo feito de uma série de  pequenos medos insignificantes. (...) Medo de estar sozinha. Medo de ter medo. Medo de morrer, bobamente. Então, nessa reflexão que me desnudava vergonhosamente diante de mim mesma, compreendi que ainda era um ser medíocre e banal. Que ainda não havia sofrido a ponto de ter no ventre a fúria necessária para lutar até a morte por minha liberdade. Ainda era um cão que, apesar dos golpes, esperava sua tigela". (pág.22)

            “Eu decidira que eles não me fariam mal. O que quer que acontecesse, não teriam acesso à minha essência. Senti que, se pudesse permanecer inacessível, evitaria o pior. (...) Compreendi que estava além do meu medo e murmurei:
            - Há coisas mais importantes na vida.
            A raiva me abandonou , dando lugar a uma extrema frieza. A alquimia que se operava em mim, imperceptível do exterior, substituíra a rigidez de meus músculos por uma força no corpo que se preparava para enfrentar os choques da adversidade. Não havia resignação, longe disso, e tampouco qualquer especulação. Eu me observava de dentro, media minha força e minha resistência, não pela capacidade de dar golpes, mas pela capacidade de recebê-los, como um navio que, apesar de fustigado pelas ondas, não afunda.” (págs.24/25).

            “Mas sobrevivi numa lucidez recém-adquirida. Sabia que, de certa forma, ganhara mais do que perdera. Não tinham conseguido me transformar num monstro sedento de vingança. (...) já sabia que tinha a capacidade de me libertar do ódio e vi naquele exercício minha mais apreciável conquista. Cheguei à jaula, vencida, mas certamente mais livre do que antes, tendo tomado a decisão de me isolar, de esconder minhas emoções.” (pág.26)

            “Eu tinha visto e ouvido coisas de mais” (pág.32)

            “Não teria forças para enfrentar outros dias como aquele. Devia me proteger, inclusive de mim mesma, pois estava claro que eu não tinha condições para suportar por muito tempo o regime em que me mantinham. Fechei os olhos antes que caísse a noite, mal respirando, na esperança de ver diminuir o sofrimento, a angústia, a solidão, o desespero. Durante as horas dessa noite sem sono e os dias que se seguiram, todo o meu ser iniciou curioso caminho da hibernação da alma e do corpo, esperando a liberdade como se fosse a primavera.
            O dia seguinte chegou, como todas as manhãs e todos os anos de toda a minha vida. Mas eu estava morta. Tentava povoar as horas intermináveis, ocupando meu espírito com outra coisa que não eu mesma, mas o mundo não me interessava mais”. (pág. 35)

            “Uma vez longe do perigo, com o coração bem ancorado na realidade, percebi que o apaziguamento por ter reencontrado minha liberdade não podia nem de longe ser comparado com a intensidade do martírio que vivi. (...) a recompensa para o esforço, a coragem, a tenacidade, a resistência, não era a felicidade nem a glória. O que Deus ofereceria como recompensa era o descanso. Para apreciar a paz é preciso envelhecer”.(pág.38)

E segue a leitura..!

Um comentário:

  1. Mari querida, muito obrigada pela indicação do livro, pelos trechos citados e por esse blog tão fofo e ao mesmo tempo comprometido com seus sonhos e ideais. Um pedacinho desse ser lindo que é vc, não é mesmo?!! = ))

    Já sou seguidora, e quem sabe colaboradora uma hora dessas?!!

    Beijo no coração, desejando todo sucesso para o seu blog,

    Carla.

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